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INVESTIGANDO O SABER DOCENTE DO PROFESSOR DO CURSO DE PEDAGOGIA

Zeila Miranda Ferreira  -  Professora do Centro Universitário de Patos de Minas - MG (Unipam) 

Este trabalho consistiu em apresentar os resultados e as reflexões decorrentes de um estudo realizado na sala de aula, pesquisando a prática pedagógica dos professores-formadores, egressos dos cursos de licenciatura, que ministravam aula no curso noturno de Pedagogia. 


A investigação teve como objetivo verificar de que modo os conhecimentos didático-pedagógicos, estudados especificamente nas licenciaturas, contribuíam para que o professor egresso desses cursos, efetivasse uma ação pedagógica competente, reflexiva e inovadora.  


Investigou-se até que ponto os docentes levavam em conta, em sua prática educativa, os aspectos afetivos, cognitivos, sociais e éticos na formação dos futuros pedagogos, assim como a influência dessa ação pedagógica nas condutas e atitudes dos alunos durante as aulas. 


Os resultados indicaram a urgência na revisão da proposta de formação inicial dos professores, transformando-a num saber-fazer permanente. A prática pedagógica deve ser uma ação consciente e, para que se efetive, a formação inicial e contínua devem se complementar, sendo construídas nos parâmetros de desenvolvimento de competências, visando formar um profissional-professor ético, autônomo, reflexivo e capaz de agir nas complexas circunstâncias do contexto educacional.

Palavras Chaves: Formação por competência   -  prática pedagógica  -  profissional reflexivo 

INVESTIGANDO O SABER DOCENTE DO PROFESSOR DO CURSO DE PEDAGOGIA

 

Dada a importância de que se reveste o papel desempenhado pelo professor-formador no desenvolvimento de capacidades e competências cognitivas e metacognitivas de seus alunos, futuros-professores, pareceu necessário pesquisar a questão da formação de professores, seja ela inicial ou contínua, respeitando-se suas especificidades,  com o intuito de discutí-la. 


Não se tem dúvidas dos problemas atuais e das dificuldades enfrentadas por profissionais da educação, especialmente na prática do ensino. Porém, as discussões sobre a realidade educativa, precisam ser constantes na ação docente, tentando buscar soluções e ações a serem desenvolvidas, juntamente com os alunos, no cotidiano na sala de aula, pois, sem a compreensão do que se faz, sem as competências necessárias para desenvolver o conhecimento nos diversos âmbitos, sem a consciência do saber pensar e refletir e, sobretudo, sem a vontade de buscar inovações e mudanças no desempenho de seu trabalho, a ação pedagógica do educador não passa da mera reprodução de conteúdos e atividades definidas por outrem.  


Portanto, este trabalho teve o propósito de contribuir, de forma geral, com os profissionais da educação, discutindo e analisando a formação de educadores, através da proposta de investigar e descrever a prática pedagógica dos professores-formadores, egressos dos cursos de licenciatura, que lecionavam no curso noturno de Pedagogia. A investigação foi desenvolvida, visando atender aos seguintes objetivos: 


•    Estudar até que ponto os conhecimentos didático-pedagógicos, específicos dos cursos de licenciatura, possibilitavam ao professor egresso desses cursos efetivar uma ação docente reflexiva e crítica;


•    Investigar até que ponto os docentes levavam em conta em sua prática os aspectos afetivos, cognitivos e éticos na formação dos futuros pedagogos;


•    Valorizar o paradigma do professor reflexivo como um profissional competente, ético, com ação-reação reflexiva, autonomia e capacidade de desenvolvimento diante do atual contexto social e educacional;


•    Contribuir com a transformação e a construção da formação inicial e contínua de professores, com base no desenvolvimento de suas competências, visando um educador que se utiliza da autonomia e da ação reflexiva na sua prática pedagógica; 


•    Identificar as condutas e atitudes expressas pelos alunos, futuros profissionais-pedagogos, durante as aulas, frente à ação pedagógica dos professores. 


Em princípio, teve como questionamento problematizador: 
    A formação inicial do professor das diversas licenciaturas habilita-o para exercer, com competência e atitude reflexiva, uma prática pedagógica eficiente no curso de Pedagogia? 

A justificativa para a escolha do tema: “A prática pedagógica: investigando o saber docente do professor do curso de Pedagogia”, partiu das inquietações da autora, por observar na situação educativa, especificamente no ensino superior, algumas contradições na prática pedagógica dos professores-formadores, assim como, também, algumas incoerências quanto às condutas dos alunos, futuros pedagogos. 


Por um lado, a investigadora indignava-se por notar que os professores-formadores atuavam com certo “descaso” e “comodismo” em suas ações didático-pedagógicas. Assim como não dominavam, aplicavam pouco ou quase não utilizavam, na prática profissional, os saberes pedagógicos teóricos e práticos adquiridos em sua formação inicial. 


Entende-se que, supostamente, esses conhecimentos didático-pedagógicos básicos deveriam melhor preparar o educador para desenvolver o papel de um professor mais competente e comprometido no exercício de suas funções profissionais. No entanto, muitos docentes-formadores não expressavam essas características em suas ações na sala de aula e não se preocupavam em usar os saberes pedagógicos, nem que fosse para organizarem melhor seu trabalho. A partir dessa constatação, pergunta-se:


•    Por que os professores não lançavam mão desses conhecimentos pedagógicos nas suas intervenções educativas, se eles os estudaram em suas licenciaturas e, a princípio, deviam dominar e empregar esses saberes na sua prática? 


•    O que se pode esperar, então, desse professor cuja ação docente parecia resistir à compreensão de que era possível melhorar as condições pessoais e adquirir as competências profissionais necessárias para aperfeiçoar sua prática pedagógica? 


•    Qual era a concepção de cidadão desse professor, se sua ação pedagógica estava longe de cumprir o seu papel social - “ensinar para aprender”, assim como propiciar aos seus alunos oportunidades de “aprender a aprender”? 

Por outro lado, entende-se que o período de formação inicial deveria ser aproveitado pelos alunos, para que pudessem adquirir e construir os saberes teóricos e práticos, necessários para sua formação enquanto profissionais mais autônomos e competentes.


No entanto, notava-se nos alunos do curso de Pedagogia um certo ar de "comodismo", "desinteresse" e "descompromisso" em relação à sua condição de aluno, de aprendente da prática pedagógica e formação profissional. A partir dessa constatação, surgiram as seguintes questões:


•    Como justificar a desmotivação dos futuros pedagogos nas atividades de classe e a pouca dedicação aos estudos, num contexto que deveria ser tão importante para a formação de suas competências, como no período de formação inicial? 


•    Se um dos objetivos da formação em Pedagogia é preparar os alunos para serem profissionais com capacidade técnica e humana para atuarem na educação, como eles conseguirão atender a esse objetivo, se não estão  formando-se numa perspectiva prática para a reflexão, a autonomia e a competência? 


•    Como esse estudante poderá desenvolver-se numa perspectiva de formação para a competência, se ele não reflete, não analisa as suas condutas na sala de aula e, na maioria das vezes, nem sabe por que fez opção pelo curso de Pedagogia?
 
A escolha do campo de investigação na Pedagogia justificou-se pela compreensão de que nesse curso, especificamente, o aluno deveria adquirir técnicas, conhecimentos próprios e específicos para utilizar na sua ação docente. 


Nesse sentido, o período de formação inicial foi entendido, neste trabalho, como fundamental para a aquisição dos saberes pedagógicos específicos para os alunos, assim como importante na definição da profissão, tanto por docentes, quanto por alunos. O professor-formador, nesse contexto, poderia desempenhar um papel essencial na formação de sua profissionalidade, numa perspectiva crítico-reflexiva, proporcionando aos alunos as oportunidades de contato com os meios de pensar autônomos e participativos. 


No entanto, deparou-se com a situação de uma Pedagogia que, de acordo com ESTRELA (1992:13), “não existe enquanto ciência e que o ‘corpus’ formado pelas Ciências da Educação não constitui uma resposta válida para que a Pedagogia adquira o estatuto de Ciência.” 


Além dela não ter o seu regulamento científico definido, de ser colocada como um campo de aplicação de pressupostos de outras ciências, tais como a Sociologia, a Psicologia, a Economia, a Psicanálise e a Psicossociologia, ela não possibilita ao professor o domínio da ciência pedagógica, para intervir de modo eficiente na aprendizagem do aluno no contexto real da sala de aula. Diante dessas circunstâncias, pergunta-se:


•    Qual seria, então, o papel a ser desempenhado pela Pedagogia na formação do profissional-professor e dos seus alunos, aprendentes da profissão?  


•    Quais seriam os saberes que a formação em Pedagogia deveria proporcionar para a formação de um profissional-professor autônomo, reflexivo e participativo?   


Desse modo, acredita-se que as questões aqui colocadas, sobre a formação, os professores e os alunos do curso de Pedagogia, confirmaram a necessidade de estudos sobre o processo educativo, principalmente no que diz respeito à formação inicial e contínua dos professores.


Os poucos estudos existentes sobre a formação de educadores demonstraram, também, a necessidade de pesquisas e ações mais efetivas nessa área. 


Conforme as estatísticas apresentadas por Marli Afonso de André , sobre a formação de professores no Brasil, no período de 1990 a 1998, foram realizados 6.244 trabalhos, sendo que apenas 410 deles -  média de 6% do total - eram pesquisas voltadas para a formação docente. 


Quanto ao exame dos trabalhos sobre o tema da formação inicial, de 155 estudos, apenas 9 % eram sobre a Pedagogia. 
Quanto aos aspectos investigados sobre o aluno da Pedagogia,  também, foram poucas as investigações, apresentando-se apenas 04 (quatro) estudos e 02 (dois) trabalhos sobre os professores desse curso.


Assim, Marli André sintetizou os resultados de sua pesquisa com a seguinte conclusão:
“(...) a primeira constatação a se fazer é de que o número de pesquisas sobre a pedagogia é pequeno, representando 9 % do total de estudos sobre a formação inicial. (...)as avaliações do curso se limitam a aspectos internos, como o currículo, ou um fragmento do curso, como uma disciplina. (...) junte-se a isso o número limitado de pesquisas sobre o professor e o aluno da pedagogia, o resultado final é um quadro muito pobre e um conhecimento muito parcial desse nível de formação ” ANDRÉ (2000).


Dessa forma, foi possível verificar que poucas foram as pesquisas desenvolvidas, tendo como objeto de estudo o curso de Pedagogia e a formação de professores. Foi escasso também, o número de investigações sobre os alunos e educadores desse curso, fato que confirmou a importância deste estudo, no sentido de ampliar as discussões e revelar como se apresentou a realidade nos “bastidores” de um curso de formação de pedagogos.

Este trabalho orientou-se pelas diretrizes teóricas de DEWEY (1933, 1959), SCHÖN (1987), PÉREZ GÓMEZ(1998),  GIMENO SACRISTÁN (1982,1998), ALARCÃO (1989a, 1996), PIMENTA (1997), NÓVOA (1995), MARCELO  GARCIA (1989), ZEICHNER (1993), POPKEWITZ (1996), DEMAILLY (1996) que vêm estudando as questões da formação inicial, contínua, a prática docente, a postura ética, as atitudes profissionais, o processo de desenvolvimento pessoal e profissional do professor. 
Esses autores lembram que a formação implica crescer e inter-relacionar-se nessas dimensões, sendo que o processo de desenvolvimento e interação exige, entre outros aspectos, investimentos pessoais, criatividade, entusiasmo, responsabilidade, reflexão pessoal e profissional, predisposição e motivação para mudanças, que darão estrutura para a formação da identidade pessoal e profissional do professor. 
Diante do contexto educativo atual, propôs-se, neste trabalho, como ponto de partida, uma perspectiva crítica do sistema educativo, na qual a formação inicial esteja assentada na concepção de competência profissional, sugerida pelos autores RALHA SIMÕES (1995); ESTRELA (1990); PERRENOUD (1993), IMBERNÓN (1994), entre outros, cuja efetivação reclama mudanças nas práticas de formação, incluindo a estruturação das escolas e instituições formadoras, com ênfase na formação do professor reflexivo.


Essa prática, baseada, principalmente, no saber fazer didático, conforme apontaram os estudos de SNYDERS (1974), SUCHODOLSKI (1978) e SAVIANI (1983), vem expressando o predomínio das tendências tradicionais de ensino, com a formação específica limitada à docência em geral, que não tratou das demais dimensões da atuação, com enfoque prático instrumental, preparando o docente para ser um transmissor técnico de propostas prontas, e não um profissional que domina suas ações, que tenha autonomia para tomar decisões. Não há articulação entre saber geral e saber pedagógico, pois, "(...) os conteúdos, os procedimentos didáticos, a relação professor-aluno não têm nenhuma relação com o cotidiano do aluno e muito menos com as realidades sociais. É a predominância da palavra do professor, das regras impostas, do cultivo exclusivamente intelectual." (LIBÂNEO, 1982). 


Entretanto, as novas tendências de formação de professores apontam para que a escola possa colaborar com a formação do cidadão, com igualdade de direitos ao proporcionar o acesso aos conhecimentos. A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Nº 9.394 / 1996, no artigo 2º, estabelece que “a educação (...) tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” BRASIL(1996). Envolve, portanto, o desenvolvimento dos aspectos pessoal e político dos professores e alunos, implicando que a educação e, especificamente, a formação de professores visem o desenvolvimento das múltiplas capacidades do indivíduo, das relações de autonomia e não tenha como objetivo, somente, o aspecto cognitivo.
Desse modo, o conhecimento pedagógico foi concebido aqui numa perspectiva crítica, política e social, como um processo que envolve todas as questões relacionadas com o ensino e a aprendizagem. 


TAVARES (1993) indicou que é preciso entender que o ensino e a aprendizagem estão fundamentados numa determinada concepção de ciência, mundo, homem, que explicam e facilitam a compreensão global do processo educativo e abrem espaço para uma discussão muito além da simples análise de regras didáticas. Essa concepção apontou para a formação não só de um professor, mas também de um aluno reflexivo. O ensino e a aprendizagem são processos em que se inter-relacionam professores e alunos, sendo eles, portanto, responsabilidade de ambos. 


Nesse sentido, compartilhou-se com as reflexões de Terezinha Azerêdo Rios (1999), defendendo uma profissionalização baseada na competência do educador e apontando a dimensão ética na questão da qualidade do trabalho e do dever ser do professor. O desempenho docente está intimamente ligado com o “saber-fazer-bem” o seu trabalho, ocupar o lugar que lhe compete na organização social, mas exige o valor nas atitudes do professor. Além do dever, o  saber, o querer e o poder devem articular-se no desenvolvimento das competências do educador.


O aluno, também, precisa mudar sua postura, sair do comodismo de espera  tradicional pelo professor, deixar de ser imaturo, assumir que já é adulto e definir o que deseja ser, o que gosta ou não de fazer, se quer ou não ser professor. Precisa empenhar na sua autoformação e autonomia, descobrindo as potencialidades que tem e, segundo ALARCÃO (1996), “só o conseguirá se reflectir sobre o que faz e sobre o que vê fazer.”


O professor foi concebido, neste trabalho, como um formador, facilitador da aprendizagem, que deve desempenhar, conforme SCHÖN (1987), basicamente, três funções: abordar os problemas que a atividade coloca-se, escolher na sua ação os procedimentos formativos que são mais adequados à personalidade e aos saberes do aluno e tentar estabelecer com ele uma relação propícia à aprendizagem. 
Aliás, o homem  é um ser de relação, que faz parte de um sistema contextual, relaciona-se com o mesmo e no caso do docente, relaciona-se com os alunos, com os colegas, com seus superiores e as demais pessoas com que interage em contatos específicos e particulares, ou seja, o professor faz parte de um grupo. 


Desse ponto de vista, no ensino, o grupo de professores deveria reunir-se, sempre para estudar, ajudar uns aos outros a crescer e a desenvolver-se, trabalhando, convivendo e resolvendo a dificuldades juntos, aproveitando para refletirem sobre todas as situações educacionais e sociais que acontecem na rotina diária, até chegar-se a um consenso quanto à possível solução. 


Nesse sentido, PICHON-RIVIÉRE citado por BLEGER (1991:30), propõe o grupo operativo como mais um instrumento e alternativa de formação:  


“(...) o grupo operativo tem objetivos, problemas, recursos e conflitos que devem ser estudados e considerados pelo próprio grupo, à medida que vão aparecendo; serão examinados em relação com a tarefa e em função dos objetivos propostos.” (PICHON-RIVIÉRE,1961) .

A nova proposta de formação dos professores, segundo CRÓ (1998) e NÓVOA (1992), tem, em seu ponto alto, o processo de desenvolvimento pessoal, que o próprio educador e o aluno devem impor-se, para que adquiram, progressivamente, maturidade emocional, equilíbrio contínuo das relações interpessoais, especialmente, as de professor-aluno.


De acordo com essa concepção, o professor assumiria maior diversidade em sua função, que passaria a ser baseada  na construção reflexiva e racional da competência, da aptidão, da capacidade e “traduzir-se-ia  num  saber,  saber-fazer,  sentir,  ser  em experiências e valores vividos e a viver ...” (CRÓ,1998:16). 


Como em qualquer área de atuação, “o conhecimento profissional do professor representa o conjunto de saberes que o habilita para exercer o magistério e todas as suas funções profissionais.” (BRASIL,1999). 


É consenso entre vários estudiosos que este conjunto de saberes - o conhecimento profissional - é um processo construído e desenvolvido sobre diversas competências. PERRENOUD (1999), definiu competência como sendo a “capacidade de agir eficazmente em determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles.” 


Desse modo, quais seriam as competências a serem desenvolvidas pelo professor?
Existem muitas propostas e possibilidades de se organizar e caracterizar o que seria o conhecimento profissional a ser adquirido pelo professor para que atuasse eficazmente. Neste trabalho, optou-se pela organização  dos conhecimentos propostos pelos Referenciais Curriculares Para a Formação de Professores, da Secretaria de Educação Fundamental – Ministério da Educação (1999), que sugeriram aos cursos brasileiros de formação de professores, garantir cinco âmbitos de conhecimentos com igual importância: 


a)    Conhecimento sobre crianças, jovens e adultos; 
b)    Conhecimento sobre a dimensão cultural, social e política da educação;
c)    Conhecimento da Cultura geral e profissional; 
d)    Conhecimento pedagógico; 
e)    Conhecimento experiencial contextualizado em situações educacionais. 


Considerou-se que, embora fossem assim explicitados, estes saberes  profissionais estão intimamente ligados, não têm vida própria e se inter-relacionam dentro da atuação dos professores, não se vinculando à nenhuma disciplina ou área exclusiva. 


Para se efetivarem transformações na prática educativa, é fundamental que o professor tenha uma concepção de ensino que irá diferenciar sua ação. 


Uma das atividades do educador é o ensino e, segundo PÉREZ GÓMEZ (1998), ensinar “é uma atividade prática que se propõe dirigir as trocas educativas para orientar num sentido determinado as influências que se exercem sobre as novas gerações”. 


Assim, para desenvolver um ensino reflexivo, o professor precisaria sempre se questionar, estar aberto às novas ideias e avaliar suas ações, para que sua orientação às novas gerações fosse mais segura e eficaz, proporcionando um ensino que facilitaria o processo de, 
“(...) transformação permanente do pensamento, das atitudes e dos comportamentos dos alunos/as, provocando a comparação de suas aquisições mais ou menos espontâneas em sua vida cotidiana com as proposições das disciplinas científicas, artísticas e especulativas, e também estimulando sua experimentação na realidade”. (PÉREZ GÓMEZ,1998:70)


A atividade prática do professor deveria ser percebida como fonte de conhecimento através da experiência e da reflexão, integrando as competências, apreciando a própria habilidade no agir, dialogando com a própria ação e aceitando os desafios e dificuldades que ela provoca. Para PÉREZ GÓMEZ (1998) a ação “deve assentar-se sobre o bom julgamento ilustrado pelo saber e apoiar-se num senso crítico e ético que seja capaz de apreciar o que convém fazer, o que é possível e como fazê-lo dentro de determinadas circunstâncias”. 


Tais considerações induzem a se pensar de outra maneira a questão primordial dos estágios, já que, de certa forma, impõe-se a eles, outras funções, conforme aponta ALARCÃO (1996):


“Esta situação de prática orientada, que tem como principal objectivo uma iniciação à profissão, não se pretende que seja - é preciso dizê-lo  - uma imitação do mestre, mas um espaço de verificação de alternativas possíveis para agir em situação. (...) Envolve uma estratégia pessoal, heurística, em que a experimentação e a reflexão como elementos autoformativos desempenham um papel de primordial importância e assenta na idéia de que ninguém pode educar o formando se ele não se souber educar a si próprio.” ALARCÃO (1996).

Os conteúdos de ensino, foram entendidos, neste trabalho, com significado dinâmico, numa perspectiva de construção social, levando-se em conta a sua concepção histórica e cultural. Desse modo, o currículo também reflete a sociedade na qual está inserido e adquire sua forma;  daquela, provêm os conteúdos que são considerados fundamentais ao processo educativo, porque dessa sociedade, origina-se toda a cultura, os valores e a ética do educador, que colaborarão na escolha e definição dos conteúdos do ensino, considerados adequados à escolaridade do aluno e às atividades sociais determinantes das profissões. 

Os sujeitos participantes deste trabalho, foram os  professores-formadores e os alunos, futuros professores da educação básica, do curso noturno de Pedagogia, de uma instituição de ensino superior, particular, localizada na região do Triângulo Mineiro.
Foram convidados 20 (vinte) professores do Departamento de Pedagogia; desse grupo, concordaram participar da investigação, 06 (seis) educadores: 04 (quatro) professoras e 02 (dois) professores, com faixa etária variando entre 27 (vinte e sete) e 55 (cinqüenta e cinco) anos, graduados nas seguintes áreas do conhecimento: 01 (uma) em  Pedagogia, 01(uma) em Psicologia, 01 (uma) em História, 01 (uma) em Serviço Social, 01 (um) em Filosofia/Teologia e 01 (um) em Filosofia. 


Esses professores foram contratados pela instituição através de processo seletivo que se deu com a análise de seus currículos, entrevistas e documentos que comprovavam sua graduação. Tais fatos garantiram à pesquisadora que os docentes tiveram acesso aos conhecimentos específicos didático-pedagógicos e demais exigências de seus cursos de formação inicial. 


Todos eles disseram que aprofundaram seus conhecimentos, através de cursos e estudos diversos; todos haviam concluído no mínimo 01 (um) curso de especialização Lato Senso;  01 (um) havia concluído o doutorado, 03 (três) haviam concluído o mestrado e 02 (dois) eram  mestrandos.


O tempo de experiência de cada professor desse grupo, no ensino superior, variava e, especificamente, ministrando aulas no curso de Pedagogia investigado, o tempo de serviço oscilava entre 05 (cinco) e 13 (treze) anos. A professora graduada em História, atendendo ao convite da administração da IES, ministrava aulas nessa escola por mais de seis anos; já se havia aposentado por tempo de serviço prestado a outras instituições, tendo, portanto, um total de mais de 25 (vinte e cinco) anos de prática no magistério.  


Todos eles ministravam as disciplinas relacionadas com suas habilitações específicas, nos diversos períodos do curso de Pedagogia, assim também em outros cursos de graduação tais como, Direito, Serviço Social, Psicologia, Fisioterapia, Informática, Economia, Administração, Secretariado, Biologia, Geografia, Letras, entre outros. Dois deles ministravam aulas também em alguns cursos de especialização e 01 (um) deles, no mestrado dessa mesma IES. 


Os alunos-sujeitos, eram estudantes do primeiro, segundo, quarto, sétimo e oitavo períodos do curso noturno de Pedagogia. A maioria era do sexo feminino e tinha idade entre 20 (vinte) e 55 (cinqüenta e cinco) anos.


Muitos deles haviam concluído o ensino médio na Escola Normal  e quase todos estavam num curso superior pela primeira vez. Havia entre os alunos, 01 (uma) aluna graduada em Advocacia e 01(uma) aluna que cursou Ciências Ccontábeis. Notava-se que, de forma geral, esses alunos tinham baixa renda financeira, e por isso, trabalhavam para ajudar nas despesas com a faculdade e a família.


Mais da metade desses alunos eram professores concursados, lecionando no ensino básico das escolas municipais e estaduais. Uns eram professores contratados ou estagiários das escolas particulares e outros trabalhavam em instituições federais, repartições públicas, postos de saúde, hospital e comércio. De forma geral, atuavam como vendedoras do comércio local, secretárias, sacoleiras, caixas de supermercado, enfermeiras, auxiliares contábeis, empregadas domésticas, caixa executivo, policial militar, e uma parte da turma estava desempregada.  


Pequena parte dos alunos desenvolvia alguma atividade paralela ao curso e ao trabalho, atuando como professores voluntários em igrejas e aulas particulares, 01(uma) aluna era diretora administrativa de uma igreja evangélica e alguns eram integrantes de atividades filantrópicas em diversos grupos religiosos.


Para facilitar o pagamento da matrícula e das mensalidades daqueles alunos, que eram professores das escolas municipais de educação básica, a IES firmou um convênio com a Prefeitura Municipal da cidade e reduzia em 50% o valor das mensalidades dos aprovados no vestibular dessa escola superior.


Quanto aos procedimentos metodológicos, optou-se nesta investigação, pelo paradigma qualitativo de pesquisa, por acreditar que as indagações sobre a produção de conhecimentos nesse enfoque seriam adequadamente aplicáveis à prática educativa. 


A coleta de dados deu-se através da observação participante, entrevistas semi-estruturadas, não-estruturadas, questionários e análise documental. Foram observadas 10 (dez) horas-aula de cada professor, perfazendo um total de 60 (sessenta) horas-aula, incluindo as que foram destinadas às avaliações; 20 (vinte) horas de participação em eventos extras, sendo 10 (dez) horas de “visitas” à “IV Semana do Curso de Pedagogia” e 10 (dez) horas na “Reunião Científica” da instituição. Foram realizadas individualmente, 40 (quarenta) entrevistas semi-estruturadas, com duração em torno de 01(uma) hora cada uma, obtendo-se um total de 40 horas de entrevistas com os alunos.

Um dos motivos de se pesquisar lançando mão da abordagem qualitativa, foi por considerar que as pessoas agem em função e de suas crenças e seus valores, determinando comportamentos que não são facilmente interpretáveis. Na tentativa de “desvendá-los” é que se buscou a investigação naturalística que proporcionou, neste estudo, um enfoque interpretativo da ação docente, com a intenção de investigar como se dava a prática pedagógica dos professores do curso noturno de Pedagogia, e como agiam os alunos frente a essas práticas na sala de aula. 


Esse enfoque, permitiu situar a ação pedagógica do professor na sua realidade social, que é dinâmica e está em constante modificação. A partir da compreensão de que “a realidade social é uma criação histórica, relativa e contingente, do mesmo modo que se constrói pode se transformar, reconstruir ou destruir” (PÉREZ GÓMEZ, 1998:102), pode-se entender, também, que o cotidiano dos professores e alunos está inserido nessa dinâmica social e que, para interpretá-lo, devem-se considerar as múltiplas realidades que se inter-relacionam na sala de aula.


Considerou-se também que, na classe, os acontecimentos sociais eram “malhas” complexas de dados subjetivos e objetivos e, por esse motivo, tentou levar-se em conta a importância das características observáveis relacionadas à prática pedagógica dos professores, assim como a interpretação subjetiva que docentes e alunos faziam dos mesmos fatos. 


A investigação foi caracterizada por uma visão holística, entendendo-se que, para perceber o significado das condutas, deveria partir das inter-relações que surgiam dentro do contexto, nesse caso, as inter-relações professor-aluno, bem como os processos comunicacionais e o seu cotidiano.


O enfoque interpretativo que se preferiu como estratégia de investigação foi o da abordagem mista, indutiva-dedutiva, por entender que se produzia “constantemente uma interação entre as teorias (..) de trabalho e os dados, os enfoques e os acontecimentos” PÉREZ GÓMEZ (1998:106), dando oportunidade à pesquisadora de entender a complexidade dos acontecimentos, refletir sobre eles e descrevê-los durante os processos de coleta e análise de dados, deixando que dimensões e categorias de interesse surgissem de forma  livre, flexível e progressiva. 


Outra justificativa para a escolha da abordagem interpretativa, partiu da informação de ser pequena a quantidade de investigações sobre a formação de professores, através da observação direta de sua prática no contexto da sala de aula, especificamente no ensino universitário. 


Embora autores e pesquisadores, tenham diversificado seus estudos científicos sobre a formação de professor, tais como: estudos de caso, análise de depoimentos, relatos de experiência, estudos teóricos, pesquisa histórica, pesquisa-ação, análises documentais, entre outros, Marli Afonso de ANDRÉ (2000) , a partir de levantamento de dados realizados sobre o período de 1990 a 1998, no Brasil, divulgou serem pouquíssimas as pesquisas de campo que lidaram diretamente no ambiente natural. 


No balanço da referida pesquisa divulgada por ANDRÉ (2000), sobre a distribuição dos trabalhos realizados, segundo a abordagem metodológica, foi ressaltado que, do total de 410 (quatrocentas e dez) dissertações e teses sobre formação de professores, somente  31 (trinta e uma) se propuseram a fazer análise da prática pedagógica, através de observação e entrevista e realizaram-se apenas 9 (nove) estudos etnográficos. Dessa forma, pode-se verificar o pequeno número de trabalhos realizados na sala de aula, não atingindo 10% (dez por cento) do total das pesquisas nesse âmbito.


Assim, evidenciou-se, tanto pelo resultado do presente trabalho quanto pelos dados sobre formação de professores no Brasil, no período de 1990 à 1998, além de outros, a necessidade de se colocar em questão, através das pesquisas, a prática pedagógica dos professores, identificando as problemáticas próprias da situação, buscando e propondo possíveis soluções. 


Marli ANDRÉ (2000), apontou como possíveis causas para o número reduzido desses trabalhos “As dificuldades de realizar observações, em ambiente natural e num período prolongado de tempo.” Pode-se dizer que tais aspectos, provavelmente, complicaram a realização de outros trabalhos, pois, como foi confirmado na presente investigação, algumas das dificuldades enfrentadas foram as seguintes:
•    Foi exigido da pesquisadora muito tempo de dedicação para a realização do levantamento, da transcrição dos dados, do acompanhamento do trabalho, das entrevistas e das observações durante todo o processo de pesquisa; 


•    Houve dificuldades próprias desse tipo de trabalho com relação ao registro da descrição e transcrição dos dados durante e após as observações;


•    Ocorreram dificuldades de conciliar as atividades de pesquisa, de estudo e de trabalho com a família, pois foi um tipo de estudo que exigiu muito tempo da pesquisadora fora do seu lar.


Além das apresentadas, constataram-se outras dificuldades que alguns dos professores participantes dessa investigação expressaram e, principalmente, porque foram confirmadas por aqueles docentes que não concordaram em “se deixar observar” pela pesquisadora. Foram registradas as seguintes sensações:


•    Faltou o que DEWEY (1933) chamou de “abertura de espírito”, “empenhamento” e humildade dos professores que não autorizaram a observação de seu trabalho, não permitindo que fossem observados por outras pessoas. Não se percebeu, nesses docentes, o interesse de querer ouvir e trocar idéias sobre sua ação pedagógica, discutindo outras alternativas ou de enfrentar a situação proposta com curiosidade, energia, capacidade de renovar e lutar contra a rotina. Eis as respostas de alguns professores que justificaram, para a coordenadora do curso, por que não participariam da pesquisa: “Imagine, estranhos assistindo minhas aulas?”; “Não quero e não preciso de gente dando ‘palpite’ no meu trabalho!”; “Ninguém tem nada com o que faço ou deixo de fazer na sala de aula, isto é problema meu...”   


•    Pareceu insegurança e orgulho desses docentes, que não participaram do trabalho, em admitir a possibilidade de “falhar” ou “errar” na sua prática, mesmo nos aspectos que consideravam “corretos” e “adequados”, pois à medida que iriam se “expor”, poderiam ser “descobertos” pela investigadora; 


•    Medo e insegurança daqueles educadores participantes da pesquisa, em relação ao que poderia acontecer com eles, após a coleta dos dados. Alguns professores comentaram sua desconfiança, entre outros aspectos: perda do emprego, fofocas, mal-entendidos, reações negativas dos colegas e administradores. 


Os resultados desta pesquisa confirmaram que a formação nos cursos superiores, nos quais se habilitaram os professores participantes deste estudo, não contribuiu de modo satisfatório para que eles se desenvolvessem como profissionais eficientes, reflexivos e autônomos, preparados para atuarem nas complexas situações da sala de aula, num mundo globalizado, cada vez mais exigente.


Esses professores-formadores habilitaram-se em cursos de formação inicial, orientados por modelos tradicionais de ensino, moldes ainda vivos nesta instituição educacional. 


O quadro põe em debate, a concepção tradicional de educação, a função da IES, a redefinição dos saberes pedagógicos: ao currículo; à didática; à avaliação; às questões da teoria e da prática; à interação do grupo; à relação professor-aluno; à metodologia; aos conteúdos de ensino e à produção de conhecimentos pedagógicos que vêm norteando o trabalho escolar no ensino superior, além dos aspectos atuais da profissão docente.  


Este debate se faz necessário, porque, apesar das muitas discussões sobre as dimensões da formação, ainda se constatou um processo de graduação inicial desvinculado e descontextualizado das necessidades sociais e dos alunos, além da desarticulação entre o conhecimento adquirido e a prática dos professores pesquisados. 


Nesse sentido, apesar de os docentes terem adotado um discurso com os fundamentos escolanovistas, mostraram grande discrepância, comprovando que, de um lado, tem-se um quadro teórico, atualizado, que apontava a eles oportunidades de transformarem suas ações e, de outro, um quadro real, com educadores, currículo e escola, extremamente arraigados ao trabalho convencional, o que os tornava incoerentes com relação à bibliografia moderna que “estudavam”.


Esses educadores dominavam os saberes básicos profissionais, sendo que uns sobressaíam-se em relação aos outros, geralmente naqueles conhecimentos relacionados à sua habilitação e sobre determinados âmbitos.  De forma geral, o domínio das competências que deveriam ser desenvolvidas na sua formação inicial e contínua pelo docente, era insatisfatório quanto aos conhecimentos sobre os alunos; sobre a dimensão cultural, social e política da educação; os conhecimentos da cultura geral e profissional; as vivências e experiências educacionais e o conhecimento pedagógico.


Especificamente, quanto aos saberes pedagógicos, verificou-se que os professores, em sua maioria, mostravam-se autoritários; indiferentes, incoerentes com seus valores; omissos em suas funções e consideravam-se a fonte principal de reprodução de informações. Na maior parte do tempo, sua prática pedagógica era desvinculada da realidade; a metodologia de ensino adotada era a exposição oral; a teoria era desarticulada da prática e os conteúdos de ensino consistiam nas matérias organizadas rigidamente no currículo. O relacionamento com os alunos, na maioria das vezes, era mecânico e sem afetividade; a avaliação era usada para medir, controlar e pressionar o aluno e, muitas vezes, sua prática pedagógica  parecia ser dirigida pelo “comodismo”.


Diante dessa circunstância, estavam os alunos - futuros professores, que por sua vez, também comodistas, esperavam que os professores lhes transmitissem os conteúdos, “ensinassem”-lhes o que fazer, como e quando, se era bom ou não o seu desempenho, num descompromisso ímpar com a sua formação. A maioria deles participavam pouco das aulas, mostravam-se imaturos, indisciplinados, arrogantes, debochados, desatentos, desrespeitavam colegas e professores e, às vezes, eram desonestos com os professores. Outras vezes, os sentimentos que prevaleciam eram de insatisfação, de desânimo, de insegurança, de pobreza, de carência, de desgosto com o curso e vergonha da profissão de professor.

A partir desse contexto complicado, evidenciavam-se o desânimo e a desmotivação explicitados, tanto pelos professores quanto pelos alunos, o que de certa forma até era justificável. 


Diante desse quadro “des-educativo” e decepcionante, pergunta-se: O que fazer para superar essa tensão vivida por professores e alunos na sala de aula? 


Por mais angustiantes que possam ser algumas dessas circunstâncias do cotidiano destes professores e alunos, é fundamental acreditar que existe saída para a situação. 


Difícil? Sim. Talvez muito... mas é possível. Possível, sobretudo se quem estiver envolvido neste contexto, tiver vontade de mudar.
É fundamental, também, entender que não dá para mudar tudo de uma só vez. Mesmo porque, conforme se verificou neste trabalho, o cenário para uma nova profissão ainda não é necessidade e referência para todos os professores e alunos. 


É importante aceitar que as novas mudanças são lentas, exigem calma, tolerância, perseverança e longo prazo para se efetivarem. Além de que é no exercício permanente do “aprender-fazendo”, que se faz, erra-se e refaz-se para aprender. Progressivamente, a partir da maturidade e do interesse dos envolvidos no processo educativo é que torna-se possível introduzir a metodologia da formação reflexiva.


Neste sentido, abre-se um parêntese especial para referir-se  aos momentos brilhantes de cada professor participante desta investigação, que às vezes, mesmo sem se dar conta, conseguiram estar à caminho de serem competentes, críticos e reflexivos. Esses momentos foram aqueles em que eles, preocuparam-se com as dificuldades e problemas expressos pelos estudantes; que tentaram variar sua ação didática; que arriscaram outras formas de avaliação; que questionaram a baixa estima do aluno e seu desgosto com o curso; que proporcionaram entre professores e alunos, momentos agradáveis e alegres; que erraram e procuraram aprender a aprender com seu erro; que procuraram trocar idéias buscando outras formas de pensar e que, apesar de todo o esforço, ainda não conseguiram deixar entrar a “iluminação” necessária para produzirem mudanças significativas em sua práticas.  “Aqueles” professores sim... Precisavam de muito mais apoio, aplausos e reconhecimento, pois naqueles momentos, mesmo que com ações e gestos “não perceptíveis” ao olho humano, eles ainda conseguiam ser a “luz no fim do túnel”.


Entende-se que, para superarem-se as dificuldades encontradas, é preciso repensar a formação inicial e contínua, propondo diferentes  condições para o desenvolvimento de uma formação mais eficiente, que atenda às necessidades existentes. Elas apontam para uma formação baseada no desenvolvimento de competências visando a formação do professor, como um profissional reflexivo, inovador, ético e autônomo.


É preciso, também, contar com professores e alunos que, acima de tudo, tenham vontade, sabedoria e bom senso para saber que decisão tomar e queiram investir na profissão de professor, empenhando-se com responsabilidade na sua formação.


É importante que os educadores e educandos que acreditam na nova formação por competência, continuem a se “movimentar”, no sentido de rejeitarem as concepções que impõem pacotes curriculares previamente fabricados, e de buscarem maior coerência entre teoria e prática, através das reformulações de programas; estabelecimento de novas interações entre os administradores da IES, os coordenadores do curso e os professores; articulação de grupos interdisciplinares; definição de novas funções para os professores-formadores e os alunos; incentivo aos alunos a usarem e adotarem a pesquisa na sala de aula, como a metodologia do aprender fazer-fazendo; formação de grupos de estudos sobre a formação e a prática pedagógica, assim como dos diversos assuntos relacionados com a educação; entendimento de modo unificado da formação inicial e contínua num mesmo processo de desenvolvimento pessoal e profissional; valorização da ação educativa; elaboração de projetos de formação inicial e continuada para os formadores e para os alunos; colaboração para a construção da Pedagogia como ciência; participação nas discussões sobre o código de ética da profissão e atuação nos debates sobre a profissão do professor, entre outros.

Entende-se que aquele contexto e suas conseqüentes dificuldades, precisam ser compreendidas, mas devem ser exploradas e absorvidas por docentes e estudantes, no sentido de servirem de alavanca para a reflexão de sua prática. Somente refletindo-se sobre o que se faz é que se tem condição de ter atitudes conscientes, optar pela definição filosófica de homem, mundo e educação que sejam mais adequadas para dirigir, organizar e transformar a ação pedagógica, tornando-a compatível com o contexto educativo atual.


Essa transformação deve atender às necessidades da sua profissionalização, visando o desenvolvimento de suas competências, para que o professor possa alcançar um conhecimento no conjunto que seja amplo, sistêmico e holístico do contexto ensino-aprendizagem. Assim, poderá definir com segurança, que procedimentos são mais adequados para se obter melhor desempenho dos alunos, aproveitando de forma criativa, as infinitas potencialidades humanas, de modo que, ao cumprir suas funções, o docente contemple as dimensões técnicas, sociais, políticas, afetivas e éticas, formando o futuro professor a partir da integração desses parâmetros .


As competências a serem desenvolvidas devem ser pensadas como aprendizagens constantes, promovendo o desenvolvimento da autonomia profissional e pessoal, que implica a interiorização das responsabilidades próprias do professor. A atitude questionadora e o pensamento crítico do professor, incentivando os alunos a problematizarem o conhecimento, a compararem as diferentes visões de mundo e as verdades de cada um, devem ser os guias para as tomadas de decisões. Só assim, o professor terá condições de modificar, orientar e adequar os alunos, num modelo de formação que seja coerente com o  que ele adota em sua atuação. 


Desse modo, a formação desenvolvida na perspectiva crítico-reflexiva deve ser a indicação maior a ser usada pelo professor, para conseguir “quebrar” a rotina de sua prática e mobilizar sua ação, construindo-a cotidianamente. Nesse sentido, o profissional reflexivo deve ser inovador, criativo e autônomo. Peter WOODS (1995) explica que a inovação requer algo novo, que implica  criar, correr riscos, ensaiar com vários argumentos e opções, desenvolvendo a capacidade de improvisação e experimentação. 


Assim, a inovação, a criatividade,  a autonomia e a reflexão, exigem caráter e pensamento holista, participativo, que promove a investigação sobre a ação, na qual se encontram os fatores cognitivos, culturais, sociais e emocionais, mobilizando o que está dentro e fora da escola, desenvolvendo, no professor e no aluno, as competências de intervenção, integrando-os em processos cooperativos de formação na ação e enriquecendo os vínculos interpessoais durante o trabalho.


Faz-se assim a formação... começando por cada um de nós.

 

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