PRÁTICA DOCENTE: TRADICIONAL OU HUMANISTA?[1]
Zeila Miranda Ferreira[2]
Resumo: Na rotina diária, o professor explicita entre outros, o que pensa sobre o aluno, o conhecimento, a escola, as relações professor-aluno, a aprendizagem, o ensino, os procedimentos pedagógicos e a avaliação. Suas ações, atitudes e comportamentos são orientados por pressupostos teórico-metodológicos que fundamentam toda a sua prática e De acordo com a aplicação daqueles no processo ensino-aprendizagem, é que vão sendo estabelecidas as abordagens, as tendências e os modelos pedagógicos educativos.
Palavras chave: Prática docente - tendências e correntes Pedagógicas - Formação de professores
O termo tendência pedagógica será aqui utilizado para se referir à disposição natural e instintiva do professor, em adotar um ou mais modelos educacionais que influenciam e determinam sua prática pedagógica (LIBÂNEO, 1984).
SAVIANI (1983) evidenciou as bases filosóficas presentes na educação brasileira no período de 1930 até 1977. Identificou as tendências pedagógicas, definidas pelo autor como determinações gerais de uma teoria e correntes ou abordagens pedagógicas, as determinações específicas de uma teoria.
O autor distinguiu quatro concepções de educação: concepção humanista tradicional, concepção humanista moderna, concepção analítica e concepção dialética. A partir destas concepções ou tendências, o autor propõe as abordagens: tradicional, comportamentalista, cognitivista, humanista e sócio-cultural, que embasam o processo ensino-aprendizagem e definem a prática pedagógica do professor no país.
Tais concepções nem sempre se explicitam de forma consciente e reflexiva, ou seja, para o autor, o professor parece não ter idéia clara dos princípios básicos dos fundamentos filosóficos e educacionais de sua prática. Muitas vezes, tem-se a impressão de que falta a muitos deles analisar a própria prática para (re)definir como será o seu fazer pedagógico.
Consciente ou não das raízes dos modelos educacionais, é na rotina diária, que o professor explicita entre outros, o que pensa sobre o aluno, o conhecimento, a escola, as relações professor-aluno, a aprendizagem, o ensino, os procedimentos pedagógicos e a avaliação. Ao lidar com estes elementos, o professor nem sempre percebe o cunho filosófico “intencional” que vem influenciando estas concepções, a sua prática pedagógica, suas atitudes, seu relacionamento interpessoal e o que o levou a adotá-los. Esse pensamento é confirmado por LIBÂNEO (1984, p. 25), quando diz que fica claro que o “modo como os professores realizam seu trabalho, selecionam e organizam o conteúdo das matérias, ou escolhem técnicas de ensino e avaliação, tem a ver com pressupostos teórico-metodológicos, explícita ou implicitamente."
De fato, não há como separar os fundamentos filosóficos, da ação de ensinar propriamente dita, pois segundo VÁZQUEZ (1990, p.202), são eles, juntamente com as finalidades, as percepções, as representações ou conceitos, que vão gerar hipóteses, teorias e métodos essenciais, vão direcionar a "escolha" didática e orientar qual é a abordagem pedagógica que fundamentará a ação do professor em sua prática.
A escola está inserida numa sociedade historicamente contextualizada; portanto, ela expressa e explicita os interesses das classes dominantes desta sociedade. Neste sentido, as práticas escolares têm em sua essência, pressupostos filosóficos diferentes sobre o mundo, o homem e a sociedade, o que geram diferentes concepções sobre o papel da escola, do ensino, da aprendizagem, do professor, do aluno, da metodologia de ensino, da avaliação e da relação professor-aluno.
De acordo com a aplicação diferenciada destes fundamentos teóricos, pelos estudiosos e por grupos de professores em suas práticas, é no processo ensino-aprendizagem que vão sendo “estabelecidas” e efetivadas as tendências ou modelos pedagógicos educativos.
É bom lembrar que, não se pode classificar com rigor, os modelos educacionais revelados pelos professores, como sendo modelos puros ou específicos de uma determinada teoria pedagógica, assim como também não há uma única teoria que explique o fenômeno educativo em sua totalidade. SAVIANI (1983, p.65) explica as contradições:
"Os professores têm na cabeça o movimento e os princípios da escola nova. (...) porém, (...) a realidade em que atuam é tradicional. (...) A essa contradição se acrescenta uma outra: além de constatar que as condições concretas não correspondem à sua crença, o professor se vê pressionado pela pedagogia oficial que prega a racionalidade e a produtividade do sistema e do seu trabalho, isto é, ênfase nos meios (tecnicismo). (...) Aí está o quadro contraditório em que se encontra o professor: sua cabeça é escolanovista, a realidade é tradicional (...)”
Não há dúvidas de que as formas de ensino e suas “imagens” ficaram “gravadas” na memória social dos envolvidos com a educação, assim como os seus reflexos. Afinal, as construções simbólicas do passado ficam impressas e são reproduzidas na sensibilidade pessoal, profissional, histórica e cultural de cada indivíduo. Na docência, isso não é diferente.
Tudo indica que a educação e seus atores vêm carregando por anos a fio a interferência dos aspectos tradicionais no ensino, ainda vivos e presentes na escola, dirigindo e fundamentando a prática dos professores. Nesse sentido, é fundamental que os currículos dos cursos de formação inicial e contínua, possam ser elaborados visando dar ao docente, oportunidades de desenvolver e construir de forma global os diversos âmbitos do saber. Entre esses, o conhecimento sobre os sujeitos que educa, sobre a dimensão cultural, social, política, profissional e didático-pedagógica da educação. Só assim o professor terá critérios e conhecimentos para refletir acerca da própria prática, compreender, analisar e dominar as abordagens que embasam o processo ensino-aprendizagem.
Referências Bibliográficas
SAVIANI, Dermeval. “Tendências e correntes da educação brasileira”. In:TRIGUEIRO, D.M. (org). Filosofia da educação brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.
LIBÂNEO, J.C. “Tendências pedagógicas na prática escolar”. ANDE. n.6. p.11-19. 1984.
VÁZQUEZ, A. S.. Filosofia da praxis. São Paulo: Paz e Terra, 1990.
[1] Artigo publicado inicialmente no Site Artigonal.com (http://www.artigonal.com) , em 20/03/2010. Disponível em http://www.artigonal.com/educacao-artigos/pratica-docente-tradicional-ou-humanista-3672165.html
[2]Doutora em Educação pela USP, pedagoga, psicóloga, pesquisadora e professora de cursos de Graduação e de Pós-Graduação presencial e a distância da Faculdade Pitágoras e Faculdade ESAMC de Uberlândia, MG